Câmara de Salvador Discute Impactos da Ponte e Desapropriação por Hasta Pública
A capital baiana foi palco de intensos debates e discussões relevantes para o futuro da cidade e do estado durante a sessão ordinária da Câmara Municipal de Salvador, realizada em uma terça-feira movimentada. No cerne das deliberações, destacaram-se dois temas de grande magnitude: a análise do projeto de lei proposto pela Prefeitura, que busca autorizar a desapropriação por hasta pública, e os potenciais e multifacetados impactos da aguardada construção da Ponte Salvador-Itaparica, uma obra que promete remodelar a infraestrutura e a paisagem da Baía de Todos-os-Santos.
Grandes Projetos em Discussão: Ponte Salvador-Itaparica sob Escrutínio
A imponente Ponte Salvador-Itaparica, idealizada para conectar a capital ao litoral sul da Bahia, transcende a mera infraestrutura para se tornar um catalisador de transformações ambientais, econômicas e sociais. As preocupações em relação a esses impactos foram expressas pelo vereador Téo Senna (PSDB), que enfatizou a necessidade de uma análise aprofundada sobre os efeitos da obra nas comunidades que habitam o entorno da deslumbrante Baía de Todos-os-Santos.
Para fundamentar seus argumentos, o parlamentar mencionou um estudo detalhado elaborado e entregue ao Ministério Público Federal (MPF) pelo Cibergrupo Kirimurê, um coletivo ambiental engajado na preservação e na defesa da Baía de Todos-os-Santos. Este grupo, conhecido por sua atuação vigilante, solicitou ao MPF a abertura de um inquérito civil, e posterior ação civil pública, com o objetivo de impugnar o contrato de construção da ponte, que foi assinado pelo Governo do Estado. A iniciativa do Cibergrupo Kirimurê reflete a crescente preocupação da sociedade civil com a sustentabilidade e a proteção do patrimônio natural e cultural da região.
Os Alarmantes Impactos Apontados pelo Estudo
O documento apresentado pelo Cibergrupo Kirimurê, conforme detalhado pelo vereador Téo Senna, aponta para uma série de danos potencialmente irreversíveis que poderiam ser causados pela construção e operação da ponte. Entre as principais preocupações, destacam-se:
* A destruição de vastas áreas de manguezais, ecossistemas vitais que servem como berçários para diversas espécies marinhas, filtros naturais e barreiras de proteção costeira. A perda de mangues impactaria diretamente a biodiversidade e a resiliência costeira.
* A degradação de formações coralinas, que são sensíveis e cruciais para a saúde do oceano. Essas estruturas abrigam uma rica variedade de vida marinha e são indicadores da qualidade ambiental da água.
* Impactos significativos sobre a fauna e flora marinha, que seriam decorrentes das dragagens necessárias para o acesso de navios ao Porto de Salvador e para a própria implantação da ponte. O levantamento de sedimentos e a alteração do leito marinho podem desorganizar ecossistemas e afetar ciclos reprodutivos de espécies.
Além dos impactos ambientais diretos, o estudo do Cibergrupo Kirimurê também levanta a questão dos efeitos secundários sobre a mobilidade urbana. A conexão da ponte com o centro de Salvador, sem um planejamento de tráfego robusto e infraestrutura adequada, poderia resultar em um aumento substancial do congestionamento na capital baiana. Isso geraria transtornos para os moradores e afetaria a qualidade de vida, invalidando parte dos benefícios de mobilidade que a ponte visa oferecer. A discussão sobre a ponte, portanto, vai muito além da engenharia, adentrando o campo da sustentabilidade e do planejamento urbano integrado.
A Controvérsia da Desapropriação por Hasta Pública
Outro ponto que acendeu o debate na Câmara foi o projeto de lei do Executivo municipal referente à desapropriação por hasta pública. A vereadora Aladilce Souza (PCdoB), líder da bancada de oposição, manifestou que, apesar da participação da secretária municipal da Fazenda, Giovana Victer, em uma sessão anterior para esclarecer o tema, as dúvidas persistem. A proposta, que visa autorizar o município a desapropriar imóveis por meio de leilões públicos, gerou apreensão quanto à sua aplicação e aos seus potenciais efeitos.
A bancada oposicionista, conforme declarado por Aladilce Souza, inclina-se a votar contra a proposição. O principal argumento da oposição é que o projeto, em sua forma atual, poderia gerar uma insegurança jurídica considerável, tanto para os proprietários de imóveis quanto para o próprio município. A falta de clareza em certos pontos ou a amplitude de poder conferida ao Executivo municipal poderiam abrir precedentes para interpretações diversas e litígios, impactando a estabilidade das relações jurídicas patrimoniais na cidade.
Emenda Polêmica e a Defesa das Praias
Um ponto específico de controvérsia levantado pela vereadora Aladilce Souza foi uma emenda ao projeto que, segundo sua análise, poderia resultar em “sombreamento” nas praias da cidade. Embora a matéria original não detalhe o teor exato da emenda, a preocupação com o sombreamento de praias geralmente se refere à construção de edificações muito altas e próximas à orla, que projetam sombras sobre a faixa de areia em determinados horários do dia. Isso afetaria a insolação, o lazer dos banhistas e a própria atratividade turística das praias de Salvador.
O presidente da Casa, Carlos Muniz (PSDB), interveio para negar veementemente essa possibilidade, assegurando que a Câmara Municipal não aprovará matérias que gerem esse tipo de impacto negativo sobre as praias da capital. A declaração do presidente buscou tranquilizar a opinião pública e os demais vereadores, reafirmando o compromisso do legislativo com a preservação do patrimônio natural e a garantia do bem-estar dos cidadãos. O episódio ilustra a importância do controle legislativo na análise de propostas que possam ter profundos efeitos urbanísticos e ambientais.
Questões Sociais e de Saúde Pública em Destaque
Além dos grandes projetos de infraestrutura e legislação urbanística, a sessão da Câmara Municipal também abordou temas de cunho social e de saúde pública, refletindo a diversidade de pautas que permeiam o cotidiano da cidade.
O vereador Sílvio Humberto (PSB) fez um apelo direto ao Executivo municipal, solicitando que o programa Morar Melhor – Versão Entidades seja adequado às particularidades e especificidades dos terreiros de Salvador. Os terreiros, enquanto centros de culto e comunidades de matriz africana, desempenham um papel fundamental na preservação da cultura, da religiosidade e da identidade afro-brasileira na Bahia. Muitas vezes, essas instituições abrigam não apenas os espaços de culto, mas também moradias de seus membros, necessitando de atenção especial em programas de melhoria habitacional.
O parlamentar também defendeu, com veemência, o aumento dos recursos destinados a essa iniciativa. O programa Morar Melhor, em sua versão para entidades, é vital para apoiar não apenas os terreiros, mas também creches comunitárias e associações de bairro, que são pilares de apoio social nas periferias da cidade. Sílvio Humberto informou que a Comissão de Reparação da Câmara, da qual faz parte, solicitará uma audiência pública para tratar a fundo do tema, buscando soluções e garantindo que esses espaços essenciais recebam o suporte necessário para continuar suas importantes missões sociais e culturais.
O Desafio dos Pagamentos na Saúde
Ainda no campo das demandas sociais, o vereador Cezar Leite (PL) utilizou seu tempo na tribuna para agradecer publicamente ao governador Jerônimo Rodrigues pelo recente pagamento dos salários dos funcionários do Hospital Couto Maia. Contudo, o vereador não hesitou em cobrar, com a mesma veemência, a regularização dos pagamentos de outros profissionais da saúde que, segundo ele, enfrentam atrasos significativos.
Entre os casos mencionados, destacou-se a situação dos funcionários do Hospital da Mulher e de outras unidades de saúde do estado, que estariam há quatro meses sem receber seus vencimentos. A questão dos atrasos salariais de profissionais da saúde é um problema crônico que afeta a moral das equipes, a qualidade do atendimento e a própria sustentabilidade do sistema de saúde pública. A cobrança do vereador ressalta a urgência de uma solução para garantir que aqueles que estão na linha de frente do cuidado à população recebam seus direitos de forma justa e pontual.
Uma Homenagem e o Legado de um Líder
A sessão também foi marcada por um momento de reverência e memória. O vereador Omarzinho Gordilho (PDT) prestou uma emocionante homenagem ao legado do ex-vereador e reconhecido dirigente esportivo Agenor Gordilho, que faleceu no dia 16 do mês em questão. A perda de Agenor Gordilho foi sentida por toda a comunidade política e esportiva de Salvador.
Omarzinho Gordilho destacou a trajetória exemplar do ex-parlamentar, ressaltando sua incansável atuação em favor da acessibilidade e, de forma notável, sua autoria da Lei do Passe Livre no transporte público. Essa legislação teve um impacto profundo na vida de milhares de soteropolitanos, garantindo o direito à mobilidade e à inclusão social. A memória de Agenor Gordilho foi eternizada não apenas por suas conquistas legislativas, mas também por sua dedicação em construir uma cidade mais justa e acessível. A Câmara Municipal de Salvador já havia realizado um minuto de silêncio em sua homenagem na sessão do dia anterior, reforçando o reconhecimento ao legado de um verdadeiro servidor público.
A sessão da Câmara Municipal de Salvador, com sua pauta abrangente, demonstrou a complexidade dos desafios enfrentados pela capital baiana, que vão desde a gestão de megaprojetos de infraestrutura até a atenção às demandas mais básicas das comunidades e a valorização de seus profissionais. O Legislativo segue como um palco essencial para o debate público e a busca por soluções que moldarão o futuro da cidade.