Flávio Bolsonaro se Posiciona como uma Versão Moderada do Pai em Seu Comportamento Político

Flávio Bolsonaro se Posiciona como uma Versão Moderada do Pai em Seu Comportamento Político

Flávio Bolsonaro não é votado por ser quem ele é, mas por ser filho de quem é. (Foto: Anholete/Agência Senado)

Flávio Bolsonaro 2026: A Promessa e o Paradoxo da Rejeição no Cenário Eleitoral

À medida que o cenário político brasileiro de 2026 começa a tomar forma, os primeiros movimentos e as projeções iniciais capturam a atenção de analistas e eleitores. Um nome que tem despontado em recentes levantamentos é o do senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ), filho do ex-presidente Jair Bolsonaro. Ungido pelo pai como um potencial candidato à presidência, Flávio tem demonstrado uma performance eleitoral ambivalente em pesquisas de opinião, revelando um panorama complexo e repleto de desafios para sua eventual candidatura.

Os Primeiros Sinais da Disputa: Flávio Bolsonaro em Destaque

A mais recente pesquisa Genial/Quaest trouxe dados que, à primeira vista, poderiam gerar otimismo na base bolsonarista. Nos cenários de primeiro turno simulados, Flávio Bolsonaro emerge em segundo lugar, superando outros proeminentes nomes da direita brasileira. Enquanto o atual presidente Luiz Inácio Lula da Silva oscila entre 41% e 34% das intenções de voto, o senador “zero um” aparece com índices que variam entre 27% e 21%. Essa performance o coloca à frente de governadores como Ratinho Junior (PSD-PR), do Paraná; Tarcísio de Freitas (Republicanos-SP), de São Paulo; Romeu Zema (Novo-MG), de Minas Gerais; e Ronaldo Caiado (União Brasil-GO), de Goiás. Em uma simulação de segundo turno contra Tarcísio de Freitas, os números de Flávio também se mostram superiores, indicando uma vantagem inicial no confronto direto com o governador paulista.

Essa posição privilegiada nas intenções de voto, em um estágio tão inicial da corrida presidencial, é, sem dúvida, um indicativo de um capital político transferido e um reconhecimento de sobrenome que o coloca à frente de outros nomes com maior trajetória executiva. Para muitos, esse desempenho seria um forte argumento para consolidar sua candidatura e, quem sabe, unir a direita em torno de seu nome. No entanto, o universo da política é frequentemente marcado por nuances e contradições que os números brutos nem sempre revelam de imediato.

A Contradição dos Números: Alta Rejeição Precoce

A euforia inicial no campo bolsonarista, desencadeada pelos bons resultados de primeiro e segundo turno, rapidamente se depara com um obstáculo significativo e, talvez, decisivo: o altíssimo índice de rejeição de Flávio Bolsonaro. A mesma pesquisa Genial/Quaest aponta que, entre os eleitores independentes – um grupo que representa cerca de 32% do eleitorado e é considerado crucial para definir eleições –, 69% afirmam categoricamente que não votariam no senador. Este percentual é alarmante, pois supera o índice de rejeição registrado pelo próprio Jair Bolsonaro (68%) e pelo presidente Lula (64%) nesse segmento. No eleitorado geral, o cenário não é menos desafiador, com 62% declarando que não votariam em Flávio “de jeito nenhum”.

Esses números de rejeição adquirem ainda mais peso quando se observa que Flávio Bolsonaro é, paradoxalmente, desconhecido por uma fatia considerável do eleitorado. Entre os independentes, por exemplo, 17% admitem não saber quem ele é. A ciência política nos ensina que, em fases iniciais de uma campanha, candidatos com baixa notoriedade costumam apresentar índices de rejeição também baixos. Isso ocorre justamente porque a maioria do eleitorado ainda não teve a oportunidade de formar um juízo de valor a seu respeito. A rejeição, em sua essência, pressupõe alguma forma de informação, uma experiência direta ou uma associação simbólica negativa. Quando uma rejeição tão elevada surge antes mesmo de uma campanha se consolidar e antes que o candidato seja amplamente conhecido, ela raramente se dirige ao indivíduo em si, mas sim ao que ele representa ou ao grupo político ao qual está intrinsecamente ligado.

Herdeiro, Não Indivíduo

É neste ponto que se manifesta o grande dilema do senador. A leitura mais evidente dos dados sugere que Flávio Bolsonaro não é votado por suas próprias qualidades ou por uma trajetória política independente, mas sim por ser o filho de quem é. Sua carreira política, embora já inclua mandatos como deputado estadual e senador, não é marcada por uma trajetória executiva de relevância inquestionável, nem por liderança em reformas de peso no Congresso, tampouco pela construção de uma identidade política singular e autônoma. Em circunstâncias normais, um candidato com esse perfil, de pouca notoriedade e sem grandes feitos individuais amplamente reconhecidos, despertaria sentimentos mornos – nem grande entusiasmo, nem grande rejeição.

Contudo, Flávio não se apresenta como um indivíduo isolado na arena política; ele se projeta como um herdeiro político. O sobrenome Bolsonaro, nesse contexto, opera simultaneamente como seu maior ativo e seu mais pesado passivo eleitoral. Essa dualidade complexa molda profundamente sua imagem e suas perspectivas para 2026.

O Sobrenome: Ativo e Passivo Eleitoral

De um lado, o sobrenome Bolsonaro garante a Flávio um recall imediato e a transferência de uma parte significativa do capital eleitoral de seu pai. Para uma parcela expressiva do eleitorado conservador e bolsonarista, Flávio é visto como o nome indicado pelo patriarca para dar continuidade ao seu legado político nas urnas. Essa “delegação simbólica” explica por que ele consegue largar à frente de outros candidatos da direita que possuem currículos executivos mais robustos ou maior tempo de exposição em cargos de destaque. Não é necessariamente por mérito próprio, mas por uma representação familiar e ideológica que ressoa com a base de apoio do ex-presidente.

De outro lado, o mesmo sobrenome impõe um fardo político extremamente difícil de contornar. Qualquer membro da família Bolsonaro em uma disputa presidencial carrega consigo uma rejeição estrutural elevada. Embora formalmente atribuída a Flávio, essa rejeição recai, na prática, sobre o legado político de Jair Bolsonaro e tudo o que seu nome passou a significar para uma parcela majoritária da população brasileira. O eleitorado rejeita não apenas a pessoa, mas o conjunto de valores e práticas associadas à gestão e à retórica do ex-presidente: a ruptura institucional, o desprezo pelas regras democráticas, os flertes golpistas reiterados, e os ataques constantes às instituições da República.

Essa carga histórica é um peso monumental, especialmente após os eventos de 8 de janeiro de 2023 e as consequências legais que levaram Jair Bolsonaro à inelegibilidade e a investigações que podem culminar em sua prisão. O sobrenome, antes um símbolo de mudança e força para muitos, tornou-se, para outros, um emblema de instabilidade política e ameaça à democracia.

A Busca por Moderação: Um Desafio Intransponível

Consciente desse passivo, o senador Flávio Bolsonaro tem empreendido esforços para se apresentar como um “Bolsonaro moderado”. Em diversas ocasiões, ele buscou demonstrar uma postura diferente daquela frequentemente adotada por seu pai, evitando xingar adversários, mitigando a linguagem radical e adotando um comportamento que, em tese, seria mais conciliador. O esforço é, sem dúvida, compreensível do ponto de vista estratégico, visando ampliar sua base de apoio para além do núcleo duro bolsonarista e atrair eleitores mais ao centro.

No entanto, a análise política sugere que essa tentativa pode ser inócua. O sobrenome Bolsonaro, no contexto político atual do Brasil, não é neutro. Ele carrega um significado político consolidado, profundamente associado a eventos e discursos que culminaram na condição de inelegível e investigado do ex-presidente. Esse “estigma” ou essa associação simbólica negativa não se dissipa facilmente com gestos retóricos ou com a adoção de um tom mais ameno. A memória coletiva e a percepção pública sobre o que o bolsonarismo representou e ainda representa estão firmemente enraizadas, tornando a tarefa de desvincular-se da imagem paterna uma missão quase impossível no curto e médio prazo.

O Impacto na Direita Brasileira

Todas essas considerações ajudam a explicar por que a presença de Flávio Bolsonaro na disputa presidencial tende mais a embaralhar e dividir do que a fortalecer a direita brasileira. As pesquisas de opinião indicam que, com o peso inegável desse sobrenome e a rejeição estrutural que ele carrega, Flávio se configura como um candidato com enorme dificuldade de vencer um segundo turno, especialmente diante de uma perspectiva de um eventual Lula 4 – um cenário que muitos consideram desastroso para o País, implicando uma hegemonia de um único grupo político por um período excessivamente longo, com os riscos inerentes para a alternância de poder e a saúde democrática.

A insistência em manter o bolsonarismo como o eixo central e quase exclusivo da direita brasileira funciona, ironicamente, como um obstáculo significativo à reorganização de um campo político que poderia, de fato, oferecer ao eleitorado uma alternativa democrática, republicana e institucionalmente responsável. Uma direita que se alinha aos preceitos do jogo democrático, que propõe governar com base em princípios institucionais – e não destruir ou subverter as instituições – sai enfraquecida sempre que o debate público é sequestrado pelo peso e pelas controvérsias do sobrenome Bolsonaro.

A lição que emerge desse cenário é clara: para que a direita brasileira consiga se reerguer e apresentar uma proposta de governo viável e convincente para o futuro do País, será fundamental ir além da pauta e da persona bolsonarista, buscando novas lideranças e discursos que transcendam o legado, tanto positivo quanto negativo, do ex-presidente. Caso contrário, o “paradoxo Flávio Bolsonaro” continuará a ser um espelho das dificuldades de um projeto político que, embora ainda carregue força em parte do eleitorado, enfrenta barreiras intransponíveis para a conquista do poder em uma nação tão diversa e complexa como o Brasil.

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