Concessão Parcial do Dmae Autorizada pela Câmara de Vereadores de Porto Alegre

Concessão Parcial do Dmae Autorizada pela Câmara de Vereadores de Porto Alegre

A prefeitura ressalta que o Novo Marco Legal do Saneamento Básico determina a universalização dos serviços até 2033. (Foto: Elson Sempe Pedroso/CMPA))

Câmara de Porto Alegre Aprova Concessão de Serviços de Saneamento: Entenda o Impacto

Em uma sessão plenária que se estendeu pela madrugada desta quinta-feira (23), a Câmara Municipal de Porto Alegre deu um passo decisivo para o futuro dos serviços de saneamento básico na capital gaúcha. Com 21 votos favoráveis e 14 contrários, foi aprovado o projeto de lei que autoriza a prefeitura a delegar, por meio de concessão, parte dos serviços públicos essenciais de saneamento. A medida representa uma mudança significativa no modelo de gestão e na busca pela universalização dos serviços na cidade.

A aprovação deste projeto é um marco na história recente de Porto Alegre, sinalizando uma nova abordagem para enfrentar os desafios de infraestrutura e atendimento às crescentes demandas por água tratada e coleta e tratamento de esgoto. O texto votado estabelece parâmetros claros e salvaguardas importantes, visando tanto a eficiência na prestação dos serviços quanto a proteção dos interesses públicos e dos usuários.

Um dos pontos cruciais do projeto é a delimitação clara dos serviços que não serão objeto de concessão. A captação e o tratamento de água bruta, operações atualmente sob a responsabilidade do Departamento Municipal de Água e Esgotos (Dmae), permanecerão sob gestão pública direta. Essa salvaguarda visa manter o controle estratégico sobre uma das etapas mais sensíveis do abastecimento hídrico. Além disso, o projeto é explícito ao garantir que não haverá extinção de cargos públicos nem declaração de desnecessidade de servidores, mitigando preocupações relacionadas ao impacto na força de trabalho do Dmae.

A questão financeira e a destinação dos recursos são centrais para a proposta. O projeto de lei prevê que os valores arrecadados nas licitações resultantes da concessão terão finalidades bem definidas. Primordialmente, serão direcionados à modicidade tarifária, ou seja, à manutenção de tarifas justas e acessíveis para a população. Além disso, esses recursos deverão financiar novos investimentos, melhorias contínuas, e a manutenção e operação dos serviços de saneamento. Uma parte significativa desses valores será especificamente voltada ao manejo das águas pluviais urbanas e à proteção contra cheias, um tema de crescente relevância, especialmente em um contexto de eventos climáticos extremos. Essas intervenções incluem infraestrutura, habitação, mobilidade e urbanismo, todas interligadas à gestão hídrica urbana.

Justificativa e o Novo Marco Legal do Saneamento

A administração municipal defende a necessidade da concessão como um caminho inevitável para a modernização. Na justificativa do projeto, o Executivo argumenta que o modelo atual de prestação de serviços e os instrumentos jurídicos vigentes são insuficientes para atender às crescentes demandas por segurança sanitária e para cumprir a legislação federal em vigor. O pano de fundo dessa argumentação é o Novo Marco Legal do Saneamento Básico (Lei nº 14.026/2020), um divisor de águas na política de saneamento no Brasil.

O Novo Marco Legal estabelece metas ambiciosas para a universalização dos serviços até 2033. Entre elas, destacam-se a garantia de que 99% da população seja abastecida com água potável de forma contínua e sem interrupções, e que 90% dos brasileiros tenham acesso à coleta e tratamento de esgoto. Para cumprir esses objetivos, estima-se que sejam necessários investimentos massivos, na ordem de centenas de bilhões de reais, um montante que muitas prefeituras e empresas estatais de saneamento têm dificuldade em aportar por conta própria, dadas as restrições orçamentárias e a capacidade de endividamento.

O não cumprimento dessas metas do Novo Marco Legal acarreta sérias consequências para os municípios. A principal delas é a perda de acesso a recursos federais para o setor, o que agravaria ainda mais a capacidade de investimento em infraestrutura. Diante desse cenário, a delegação de serviços a empresas privadas, por meio de concessões, é vista por muitos gestores como a alternativa mais viável para atrair o capital necessário e a expertise técnica para acelerar a universalização e aprimorar a qualidade dos serviços.

O prefeito Sebastião Melo expressou sua satisfação com a aprovação, destacando a importância estratégica do projeto. “Agradecemos aos vereadores da base pela parceria na aprovação da concessão parcial dos serviços de saneamento. Validado pela população nas urnas, este projeto estratégico é crucial para o futuro da cidade e reforça o compromisso da nossa gestão com a transparência e qualificação dos serviços do Dmae”, afirmou Melo. A declaração sublinha a visão da prefeitura de que a concessão é um instrumento para qualificar e fortalecer, e não enfraquecer, o papel do Dmae na gestão do saneamento da cidade.

Emendas Aprovadas: Protegendo o Interesse Público e Social

A aprovação do projeto principal veio acompanhada da sanção de diversas emendas, que foram cruciais para aprimorar o texto e garantir maior proteção aos cidadãos e ao meio ambiente. Sete emendas, numeradas como 9, 10, 13, 14, 15, 18 e 23, foram incorporadas ao projeto, reforçando o caráter social e a transparência do processo de concessão. Essas emendas refletem o debate e as preocupações levantadas durante a tramitação do projeto na Câmara, buscando equilibrar a eficiência da gestão privada com a equidade e o acesso universal aos serviços.

Garantias Sociais e Acessibilidade

  • A emenda 9 é fundamental para a proteção das famílias de baixa renda, pois garante a manutenção da tarifa social. Além disso, impõe à futura concessionária a obrigação de assegurar o abastecimento emergencial e contínuo de água potável, um ponto vital em situações de crise ou falhas no sistema.
  • A emenda 10 visa endereçar uma questão de equidade no atendimento. Ela cria uma fila de atendimentos prioritários para chamados provenientes de comunidades em situação de vulnerabilidade socioeconômica. Isso assegura precedência na triagem, no despacho e na execução dos serviços, garantindo que as populações mais necessitadas não sejam deixadas para trás.

Investimento e Foco em Áreas Desassistidas

  • A emenda 13 institui a criação de uma conta específica e vinculada. O objetivo é garantir que os recursos sejam destinados à modicidade tarifária e, crucialmente, ao financiamento de obras de abastecimento, esgotamento sanitário e drenagem em áreas vulneráveis ou irregulares que, muitas vezes, não são contempladas nas metas contratuais padrão.
  • A emenda 14 estabelece critérios para a priorização de investimentos. Define que áreas de interesse ambiental, turístico, cultural, esportivo e econômico, bem como comunidades com baixo Índice de Desenvolvimento Humano (IDH), receberão atenção prioritária. Essa medida busca promover um desenvolvimento equilibrado e atender às necessidades de regiões historicamente desfavorecidas.
  • A emenda 15 aborda um problema prático e comum em áreas urbanas em desenvolvimento. Ela determina que a ausência de pavimentação ou de um sistema de drenagem pluvial não será um impedimento para a implantação da rede de esgotamento sanitário. Isso é crucial para expandir a cobertura de esgoto mesmo em locais com infraestrutura básica ainda deficiente.

Transparência e Governança

  • A emenda 18 reforça o controle e a fiscalização do Poder Legislativo sobre a concessão. Ela obriga o Executivo a enviar relatórios mensais à Câmara Municipal, detalhando o andamento da concessão. Essa medida promove maior transparência e permite que os vereadores acompanhem de perto a execução do contrato e o cumprimento das metas.
  • Finalmente, a emenda 23 assegura que o contrato de concessão deverá prever metas de universalização para todas as regiões de planejamento da cidade. Essa disposição é vital para garantir que a cobertura dos serviços não se concentre apenas nas áreas mais rentáveis ou desenvolvidas, mas que alcance de forma equitativa todos os bairros e comunidades de Porto Alegre.

A aprovação deste projeto, com todas as emendas incorporadas, representa um esforço para modernizar os serviços de saneamento em Porto Alegre, alinhando-se com as exigências do Novo Marco Legal e, ao mesmo tempo, blindando a população mais vulnerável e garantindo transparência e fiscalização. O caminho à frente envolve o processo de licitação e a efetiva implementação da concessão, com o desafio de transformar os objetivos do projeto em realidade para milhões de porto-alegrenses.