Aprovada em Primeiro Turno a Reforma da Previdência Municipal Após Debate Intenso na Câmara

Aprovada em Primeiro Turno a Reforma da Previdência Municipal Após Debate Intenso na Câmara

Imagem: Divulgação (essa imagem pode ter direitos autorais)

Novo Hamburgo: Reforma Previdenciária Passa em Primeiro Turno com Divisão e Polêmica

A Câmara Municipal de Novo Hamburgo deu um passo significativo para a adequação de seu regime previdenciário às normas federais, aprovando em primeiro turno, com placar de 10 votos a 4, o controverso Projeto de Emenda à Lei Orgânica (PELOM) nº 2/2025. A votação, ocorrida nesta quarta-feira, 29 de outubro, encerrou uma fase de intensas discussões que mobilizaram a sociedade, as comissões parlamentares e culminaram em uma audiência pública marcada por profundas divergências entre a administração municipal e a categoria dos servidores. A proposta visa estabelecer novas idades mínimas para aposentadoria e consolidar um modelo previdenciário de caráter contributivo e solidário, buscando a tão almejada sustentabilidade atuarial e financeira do sistema local.

A importância desta votação reside não apenas em seu conteúdo, mas também em seu rito. Por se tratar de uma alteração na Lei Orgânica Municipal, o projeto necessita de aprovação em dois turnos e exige o voto favorável de, no mínimo, dois terços dos vereadores — ou seja, 10 dos 14 parlamentares. O resultado do primeiro turno demonstrou que o Executivo conseguiu angariar o apoio mínimo necessário, mas não sem forte oposição.

Detalhes da Votação em Plenário

A sessão que deliberou sobre o PELOM nº 2/2025 foi acompanhada de perto por representantes do governo municipal e por uma expressiva mobilização de servidores públicos, refletindo a polarização do debate. A votação se deu da seguinte forma:

  • Votaram a favor (10): Daia Hanich (MDB), Deza Guerreiro (PP), Eliton Ávila (Podemos), Giovani Caju (PP), Ico Heming (Podemos), Ito Luciano (Podemos), Joelson de Araújo (Republicanos), Juliano Souto (PL), Nor Boeno (MDB) e Ricardo Ritter – Ica (MDB).
  • Votaram contra (4): Cristiano Coller (PP), Felipe Kuhn Braun (PSDB), Enio Brizola (PT) e Professora Luciana Martins (PT).

O projeto agora retorna à pauta para a segunda e decisiva votação na próxima sessão, agendada para segunda-feira, 3 de novembro. A expectativa é de que o debate e a pressão sobre os parlamentares continuem intensos até o momento final da deliberação.

Compreendendo a Proposta da Reforma Previdenciária

O Projeto de Emenda à Lei Orgânica nº 2/2025, de autoria do Executivo, promove alterações e revoga dispositivos da Lei Orgânica Municipal com o objetivo primordial de alinhar o regime previdenciário de Novo Hamburgo às diretrizes estabelecidas pela Reforma da Previdência Federal, consubstanciada na Emenda Constitucional nº 103/2019. Essas mudanças são consideradas cruciais para a longevidade do sistema e para evitar penalizações futuras ao município.

Entre as principais modificações aprovadas em primeiro turno, destacam-se:

  • Idade de Aposentadoria Compulsória: A elevação da idade de aposentadoria compulsória de 70 para 75 anos, conforme já determinado pela Emenda Constitucional nº 88/2015, buscando a uniformização com o regime geral.
  • Regra de Aposentadoria por Idade Mínima: A desvinculação da aposentadoria exclusiva por tempo de serviço e a instituição de idades mínimas para a concessão do benefício. Agora, a regra geral passa a ser de 62 anos para mulheres e 65 anos para homens, alinhando-se diretamente à Emenda Constitucional nº 103/2019. Anteriormente, a Lei Orgânica previa a aposentadoria voluntária com proventos integrais para homens com 35 anos de serviço e mulheres com 30 anos, além de regras diferenciadas para o magistério (30/25 anos) e aposentadorias proporcionais por tempo de contribuição (30/25 anos) ou por idade (65/60 anos).
  • Proventos Proporcionais: A supressão da referência a proventos proporcionais, simplificando as regras e buscando maior clareza na concessão de benefícios.
  • Aposentadorias Especiais: O texto permite o estabelecimento de regras diferenciadas de idade e tempo de contribuição para casos específicos de aposentadorias especiais, conforme previsto no Art. 40 da Constituição Federal, que contempla categorias com exposição a agentes nocivos à saúde ou que exercem atividades de risco.
  • Avaliação de Incapacidade Permanente: A obrigatoriedade de avaliações periódicas para os casos de aposentadoria por incapacidade permanente, visando a reavaliação das condições que justificaram a concessão do benefício e a eventual readaptação ou retorno ao trabalho.
  • Regulamentação por Lei Complementar: A definição de que o cálculo dos proventos e o tempo de contribuição serão detalhadamente regulamentados por uma lei complementar municipal, que será posteriormente elaborada e votada.
  • Caráter Contributivo e Solidário: O novo regime assume expressamente o caráter contributivo e solidário, o que significa que haverá participação financeira não apenas do Município, mas também dos servidores ativos, aposentados e pensionistas, garantindo a sustentabilidade conjunta do sistema previdenciário.
  • Retroatividade: As alterações entrarão em vigor na data de sua publicação, mas com efeitos retroativos a 12 de abril de 2023. Este ponto, em particular, gerou grande controvérsia e foi alvo de críticas contundentes por parte da oposição e dos servidores.

Na justificativa que acompanhou o projeto, o Executivo municipal argumentou que a revisão da Lei Orgânica é uma medida inadiável para assegurar a sustentabilidade financeira e atuarial do Regime Próprio de Previdência Social (RPPS). O governo enfatiza que a proposta busca um equilíbrio delicado entre as exigências constitucionais e as preocupações legítimas dos servidores públicos municipais, visando evitar um colapso futuro do sistema previdenciário local.

A Complexa Tramitação do Projeto

O tema da reforma da previdência tem sido um dos mais debatidos em Novo Hamburgo nos últimos meses. A discussão mais recente e acalorada ocorreu durante a audiência pública sobre o tema, realizada em outubro. Convocada pela Mesa Diretora da Câmara a pedido do Sindicato dos Professores Municipais (SindProfNH), a audiência expôs as profundas divisões e focou nos aspectos técnicos das mudanças propostas, sem conseguir conciliar as diferentes visões.

É importante ressaltar que a versão atual do projeto (PELOM 02/2025) não é a primeira a ser apresentada. Anteriormente, um projeto similar (PELOM 02/2024) havia sido protocolado pela gestão anterior, mas foi retirado pelo prefeito Gustavo Finck. A decisão de protocolar uma nova versão buscou incorporar ajustes e adequações mais precisas às regras da Emenda Constitucional nº 103/2019, que é a base da reforma previdenciária nacional para estados e municípios. Essa revisão indicou uma tentativa de refinar a proposta, mas não diminuiu a resistência de parte do funcionalismo.

A Presença do Executivo Durante a Votação

A importância atribuída à aprovação do PELOM foi evidenciada pela marcante presença de representantes do Executivo na tribuna de honra da Câmara Municipal durante a sessão de votação. O próprio prefeito Gustavo Finck e o vice-prefeito Gerson Haas compareceram, acompanhados de um time de secretários municipais: Anderson Bertotti (Meio Ambiente), Betina Espíndula (Saúde), Anne Saul (Desenvolvimento Social), Michele Vargas Antonelo (Fazenda), Ângelo Reinheimer (Cultura), Eroni Nunes dos Santos (Obras), Rosalino Seara (Segurança), Andreia Schneider (Governança), Daiana Monzon (Desenvolvimento Econômico) e André Luis da Silva (Educação). Completavam a comitiva o procurador-geral Vanir de Mattos, os assessores Michella Medeiros Rodrigues e Aloysio Flesch, e o diretor-geral da Comusa, Paulo Roberto Kopschina. A presença em peso foi interpretada por alguns como um sinal da urgência e gravidade da situação, e por outros como uma forma de pressão sobre o Legislativo.

O Debate Acalorado em Plenário

A discussão no plenário foi intensa e revelou as diferentes perspectivas sobre a reforma.

O vereador Juliano Souto (PL), vice-líder de governo, fez questão de solicitar que o Executivo utilizasse a tribuna para detalhar o projeto, dando voz diretamente ao prefeito.

Em seu pronunciamento, o prefeito Gustavo Finck fez um apelo dramático, alertando para a gravidade da situação financeira do município. “Se o Pelom não passar, a cidade vai quebrar, e o funcionalismo não receberá em dia a partir de abril ou maio do ano que vem”, afirmou, traçando um cenário sombrio. Ele destacou a falta de recursos para manter serviços básicos, como capina e roçada, e o aporte mensal de R$ 350 mil no transporte público para evitar o aumento da passagem. O prefeito enfatizou que o projeto atual já havia sido amplamente debatido e era diferente da versão anterior, sendo essencial para o futuro da cidade. Seu pronunciamento foi encerrado em meio a protestos de servidores presentes.

A vereadora Daia Hanich (MDB) defendeu seu voto favorável como resultado de uma análise cuidadosa das consequências de uma não aprovação. Expressou que sua consciência estava tranquila e que, sem o PELOM, o Instituto de Previdência e Assistência dos Servidores Municipais de Novo Hamburgo (Ipasem) enfrentaria sérias dificuldades financeiras. “A ausência de regras atualizadas pode prejudicar todos os servidores. Não quero que vocês passem o que, como funcionária do Estado, passei, recebendo parcelado e tendo de recorrer a constantes empréstimos”, declarou, compartilhando sua experiência pessoal. Para ela, rejeitar o projeto significaria “quebrar a cidade” e comprometer futuras aposentadorias. A parlamentar também manifestou preocupação com a possibilidade de servidores hamburguenses serem transferidos do regime próprio para o regime geral de previdência caso o sistema local não se adeque.

O vereador Joelson de Araújo (Republicanos) reforçou a necessidade de equilíbrio nas decisões legislativas. “Não podemos agir de forma equivocada, privilegiando uma classe em detrimento de 250 mil pessoas da cidade”, ponderou, buscando uma visão mais ampla do impacto da reforma.

Na contramão, o vereador Enio Brizola (PT) leu uma nota conjunta assinada por servidores públicos de diversos setores, reiterando a posição de que “não é justificável que o ônus recaia sobre quem já vem sendo penalizado”. Ele defendeu veementemente a realização de uma nova audiência pública, com o objetivo de “construir uma reforma justa, confiável e sustentável, sem prejudicar ainda mais o funcionalismo que trabalha com dedicação e responsabilidade”. Brizola argumentou que o projeto de emenda à lei orgânica em votação não refletia as recomendações da comissão especial da Câmara que estudou a situação do Ipasem. Além disso, questionou a obrigatoriedade da reforma, afirmando que a Emenda Constitucional nº 103 não impõe essa imposição, mas sim expressa uma “vontade política”. O parlamentar criticou ainda o fato de os trabalhadores não terem sido consultados sobre as mudanças propostas, bem como a retirada da idade diferenciada para professores e professoras, que estava prevista no projeto anterior. “Já derrotamos o Pelom uma vez e entendemos a crise financeira do município, mas não são os trabalhadores que devem pagar por essa conta”, concluiu.

A vereadora Professora Luciana Martins (PT) criticou duramente a retroatividade da lei. “É um absurdo aprovar uma mudança na Lei Orgânica retroativa a 2023 para referendar projetos de lei complementar que não poderiam ser aprovados naquele ano”, afirmou. Ela também expressou seu descontentamento com a presença maciça do alto escalão da Prefeitura durante a votação, classificando a situação como “vexatória e vergonhosa”. Em um tom de defesa da autonomia do Legislativo e da dignidade dos servidores, declarou: “O Legislativo deve ser autônomo e não precisar ser vigiado para votar. Os servidores públicos não precisam de favores. Ninguém aqui deixou de entrar pela porta da frente. Nós temos a nossa história”.

O líder do governo na Câmara, vereador Giovani Caju (PP), defendeu a aprovação do PELOM como um ato de responsabilidade fiscal e social. “Pela primeira vez na história, um governo encara números catastróficos deixados por uma gestão anterior que gastou desenfreadamente”, declarou, justificando a urgência da medida. Segundo ele, é uma decisão fundamental para garantir que, no futuro (daqui a 10 ou 15 anos), os servidores continuem a receber suas aposentadorias em dia.

O debate foi encerrado novamente por Juliano Souto, que parabenizou o Executivo pela coragem de comparecer ao Legislativo. Em sua fala final, o parlamentar criticou a postura dos representantes sindicais presentes, referindo-se a eles como “sindicato eleitoreiro que veio fazer confusão aqui dentro do parlamento”.

Com a aprovação em primeiro turno, o município de Novo Hamburgo se aproxima de uma reforma previdenciária que promete redefinir as regras de aposentadoria para seus servidores públicos. A segunda votação, crucial para a efetivação das mudanças, ocorrerá em um cenário de alta expectativa e intensa mobilização, com a cidade atenta aos próximos passos que moldarão o futuro do Ipasem e do funcionalismo municipal.