Ação da Defensoria Pública contra fim do 6º ano em escolas de Porto Alegre na Justiça

Ação da Defensoria Pública contra fim do 6º ano em escolas de Porto Alegre na Justiça

Crédito: César Lopes /PMPA

Defensoria Pública do RS Ajuíza Ação para Garantir Vagas no 6º Ano em Escolas de Porto Alegre

A Defensoria Pública do Estado do Rio Grande do Sul (DPE-RS) deu um passo decisivo em defesa da educação municipal, ingressando com uma Ação Civil Pública (ACP) nesta segunda-feira (27). O objetivo primordial é assegurar que a Prefeitura de Porto Alegre mantenha a oferta do ingresso ao 6º ano do ensino fundamental em todas as escolas da rede municipal de ensino. A iniciativa busca suspender uma controversa decisão da Secretaria Municipal de Educação (SMED), que prevê o encerramento das turmas do 6º ano em doze escolas a partir do ano letivo de 2026, uma medida que gerou grande apreensão na comunidade escolar.

A DPE-RS alerta que a alteração planejada pela SMED impacta diretamente um número significativo de alunos: 804 estudantes. Dentre eles, destacam-se 80 crianças e adolescentes com necessidades educativas especiais, um grupo que requer atenção e estabilidade ainda maiores em seu processo de aprendizagem. Além disso, a mudança afeta 252 alunos que possuem irmãos já matriculados nas mesmas instituições, evidenciando o potencial para desorganizar a rotina de centenas de famílias que contam com a estrutura e a localização das escolas atuais.

Segundo a proposta da prefeitura, os estudantes atualmente matriculados nessas unidades, ou aqueles que ingressariam no 6º ano, seriam transferidos para a rede estadual de ensino. Essa transição, no entanto, levanta uma série de preocupações sobre a qualidade, a continuidade pedagógica e a integração social desses jovens.

Defensoria Pondera a Falta de Diálogo e Transparência

O Núcleo de Defesa da Criança e do Adolescente da DPE-RS, responsável por representar os interesses das famílias afetadas, revelou ter recebido uma avalanche de reclamações. Pais, responsáveis, membros do Conselho Tutelar e a Associação dos Trabalhadores em Educação do Município de Porto Alegre (ATEMPA) expressaram profunda insatisfação com a forma como a decisão foi comunicada e implementada. Um dos pontos mais criticados é a alegada ausência de diálogo com a comunidade escolar, a falta de transparência nos processos decisórios e a não divulgação dos critérios técnicos e pedagógicos que fundamentaram uma mudança de tal magnitude.

Em um sistema educacional saudável, as grandes alterações de política pública devem ser precedidas por amplas discussões com todos os envolvidos – pais, professores, alunos, gestores e especialistas. A falta desse diálogo não apenas mina a confiança na administração pública, mas também pode levar a decisões que não consideram a realidade e as necessidades da população que será diretamente impactada. A transparência, por sua vez, é um pilar da gestão pública responsável, permitindo que a sociedade compreenda as razões por trás das políticas e fiscalize sua implementação.

Impacto Profundo na Continuidade Pedagógica e Vínculos Sociais

A Defensoria Pública enfatiza que a medida da SMED representa um sério risco à continuidade pedagógica e aos vínculos sociais dos alunos. A transição entre os anos iniciais (1º ao 5º ano) e os anos finais (6º ao 9º ano) do ensino fundamental é, por si só, um período delicado. É uma fase de adaptação a novas metodologias de ensino, maior número de professores, disciplinas mais complexas e mudanças no ambiente social da escola. Interromper essa transição com uma mudança compulsória de instituição pode ser extremamente prejudicial. Estatísticas educacionais frequentemente apontam este período como um momento de alta vulnerabilidade para a evasão escolar, especialmente em contextos de instabilidade e desmotivação.

Para crianças e adolescentes, a escola não é apenas um local de aprendizado formal; é um espaço de socialização, formação de identidade e construção de amizades duradouras. Romper esses laços sociais e pedagógicos de forma abrupta pode gerar insegurança, ansiedade e dificuldades de adaptação, afetando não apenas o desempenho acadêmico, mas também o bem-estar emocional dos estudantes. A familiaridade com o ambiente escolar, com os professores e com os colegas é um fator crucial para o desenvolvimento integral.

Adicionalmente, a DPE-RS aponta que a mudança pode desorganizar de maneira significativa a rotina de famílias com mais de um filho. Ter irmãos em diferentes escolas, muitas vezes distantes umas das outras, implica desafios logísticos e financeiros com transporte, horários desencontrados e maior esforço dos pais ou responsáveis para acompanhar a vida escolar de cada um. Este é um fardo adicional imposto a famílias que já enfrentam diversas dificuldades diárias.

Busca por Informações e a Falta de Resposta da SMED

Diante das preocupações e da crescente insatisfação, a DPE-RS tomou a iniciativa de enviar ofícios à SMED. Nesses documentos, foram solicitadas informações detalhadas sobre o número exato de escolas e alunos que seriam atingidos pela medida, os critérios técnicos e pedagógicos que embasaram a decisão e quais seriam as medidas de mitigação propostas para minimizar os impactos negativos sobre os estudantes e suas famílias. A Defensoria Pública, como órgão de proteção dos direitos, buscava clareza e soluções. No entanto, o órgão informou que a secretaria não forneceu as respostas dentro do prazo estabelecido, o que apenas reforçou a percepção de falta de transparência e de consideração com as preocupações levantadas.

A ausência de respostas de um órgão público em face de questionamentos formais de uma entidade como a Defensoria Pública é grave. Ela impede a análise adequada da situação, dificulta a busca por soluções consensuais e, em última instância, pode ser interpretada como um desrespeito ao direito à informação e ao princípio da publicidade que deve reger a administração pública. Essa omissão foi um dos fatores que impulsionaram a DPE-RS a buscar a via judicial, entendendo que os direitos fundamentais dos estudantes estavam em risco e que o diálogo administrativo se esgotara.

Fundamentação Jurídica da Ação Civil Pública

Na Ação Civil Pública, a DPE-RS sustenta que a iniciativa da Prefeitura de Porto Alegre, por meio da SMED, viola preceitos fundamentais da legislação brasileira. Primeiramente, ela afronta o direito fundamental à educação, um direito social garantido pela Constituição Federal e pelo Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA). A educação deve ser ofertada com qualidade e de forma contínua, visando o pleno desenvolvimento da pessoa, seu preparo para o exercício da cidadania e sua qualificação para o trabalho.

Em segundo lugar, a ação argumenta que a medida desrespeita o princípio da continuidade escolar. Esse princípio implica que o poder público deve garantir um percurso educacional sem interrupções bruscas, que prejudiquem o desenvolvimento acadêmico e social dos estudantes. Mudanças estruturais na rede de ensino devem ser planejadas e executadas de modo a preservar a trajetória educacional dos alunos, minimizando ao máximo quaisquer impactos negativos.

Por fim, a DPE-RS ressalta a violação dos deveres de publicidade e transparência na gestão pública. Conforme já mencionado, a falta de diálogo com a comunidade escolar, a ausência de justificativas técnicas claras e a negativa em responder aos questionamentos formais da Defensoria Pública são exemplos flagrantes de desrespeito a esses princípios essenciais para uma administração democrática e responsável. Tais deveres não são meras formalidades, mas garantias de que as decisões públicas atendam ao interesse da coletividade e possam ser fiscalizadas por ela.

Diante de todas essas violações e dos potenciais prejuízos aos estudantes e suas famílias, a Defensoria Pública do Rio Grande do Sul solicitou à Justiça a suspensão imediata da decisão da SMED. Além disso, a DPE-RS pede que o Município seja obrigado a apresentar um plano detalhado e participativo de reorganização da rede de ensino, garantindo ampla divulgação à sociedade e um prazo máximo de 10 dias para sua apresentação. A expectativa é que a justiça intervenha para proteger o direito à educação e assegurar que futuras decisões sejam tomadas com a devida consideração pelo bem-estar e o futuro dos jovens de Porto Alegre.

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