Operação Mais Letal Contra o CV: Balanço de 64 Mortos

Operação Mais Letal Contra o CV: Balanço de 64 Mortos

Agentes das forças de segurança em escadaria no Complexo do Alemão — Foto: Reprodução

Operação Mais Letal da História do Rio: Conflito Armado no Alemão e Penha Gera Caos Urbano

O Rio de Janeiro viveu um dos seus dias mais tensos e violentos, marcado por uma megaoperação policial que resultou na morte de 64 pessoas e na prisão de 81, nos complexos do Alemão e da Penha, na Zona Norte. Esta ação, que vitimou quatro policiais e dezenas de suspeitos, é oficialmente a mais letal já registrada na história do estado, conforme confirmado pelo Palácio Guanabara. A cidade foi mergulhada em um cenário de guerra, com intensos confrontos e uma série de represálias que paralisaram vias importantes e elevaram o nível de alerta.

Desde as primeiras horas da manhã, a capital fluminense sentiu o impacto da operação. No início da tarde, uma onda de retaliações orquestradas pelo tráfico de drogas espalhou-se por diversas regiões, com barricadas improvisadas que bloquearam importantes corredores de tráfego. Veículos foram tomados e entulhos incendiados na Linha Amarela, na Grajaú-Jacarepaguá e na Rua Dias da Cruz, no Méier, entre muitos outros pontos estratégicos da cidade, transformando o trajeto diário em uma jornada de medo e incerteza para milhares de cariocas.

Diante do caos instaurado e dos múltiplos bloqueios, o Centro de Operações e Resiliência (COR) do Rio de Janeiro elevou o estágio operacional da cidade para o nível 2, em uma escala que vai até 5. Este alerta reforçado demonstra a gravidade da situação e a necessidade de uma resposta coordenada das autoridades. A Polícia Militar, por sua vez, determinou a suspensão de todas as suas atividades administrativas, colocando todo o seu efetivo nas ruas para tentar conter a onda de violência e restaurar a ordem pública, em um esforço sem precedentes para lidar com a dimensão do conflito.

Escalada da Violência: A Operação Contenção e o Cenário de Guerra

A megaoperação nos complexos do Alemão e da Penha faz parte de uma iniciativa mais ampla do governo do estado, batizada de Operação Contenção. Este programa permanente tem como objetivo primordial combater o avanço e a consolidação do Comando Vermelho (CV) em territórios fluminenses, um desafio constante para a segurança pública do Rio de Janeiro. A facção criminosa, uma das maiores e mais influentes do país, tem expandido sua atuação, gerando conflitos territoriais e impondo um regime de medo em diversas comunidades.

A intervenção nos complexos da Zona Norte foi planejada para ser uma resposta contundente a essa expansão. A escolha do Alemão e da Penha não é aleatória; são regiões estratégicas para o crime organizado, servindo como bases importantes para logística e controle territorial. As comunidades, densamente povoadas e com geografia complexa, oferecem desafios únicos para as forças de segurança, que precisam navegar por vielas estreitas e áreas de difícil acesso, muitas vezes sob a mira de criminosos bem armados e preparados para o confronto.

A tensão pré-existente nos complexos é uma realidade. Residentes vivem sob constante ameaça de violência, muitas vezes apanhados no fogo cruzado entre facções rivais ou em confrontos com a polícia. A Operação Contenção busca desarticular essas estruturas criminosas, mas o custo humano e social de tais intervenções é sempre altíssimo, impactando a vida de milhares de famílias que buscam apenas paz e segurança em seus lares.

O Início da Incursão e a Reação do Crime Organizado

A ação teve início ainda no fim da madrugada, com a mobilização de um contingente impressionante de pelo menos 2.500 agentes das forças de segurança do Rio de Janeiro. Este efetivo, composto por policiais civis e militares, incluindo tropas de elite como o Batalhão de Operações Policiais Especiais (BOPE), saiu para cumprir uma centena de mandados de prisão. A magnitude da força-tarefa já indicava a expectativa de um confronto de grande escala.

A chegada das equipes aos complexos foi recebida com uma forte reação. Traficantes, que monitoravam a movimentação das forças de segurança, responderam a tiros e com a construção de barricadas em chamas, transformando as entradas das favelas em verdadeiras zonas de combate. Um vídeo chocante que circulou nas redes sociais e foi amplamente divulgado mostra a intensidade do tiroteio, com quase 200 disparos em apenas 1 minuto, em meio a colunas de fumaça que subiam das barricadas incendiadas. O som ensurdecedor dos tiros e o cheiro de pólvora tomaram conta do ambiente, instalando o pânico entre os moradores.

A Polícia Civil informou ainda que, em uma tática de retaliação e resistência, criminosos utilizaram drones para lançar bombas contra as forças policiais, demonstrando uma sofisticação na estratégia de confronto. Além disso, houve relatos de bandidos fugindo em fila indiana pela parte alta da comunidade, uma cena que remeteu à histórica “disparada” de traficantes em 2010, quando da ocupação do Alemão, um momento marcante na história recente do combate ao crime organizado no Rio. Essa manobra de fuga ressalta a familiaridade dos criminosos com o terreno e a complexidade das operações em áreas tão vastas e intrincadas.

O Preço Humano: Policiais e Civis Entre as Vítimas

O saldo de mortes da operação é trágico e reflete a brutalidade dos confrontos. Entre as 64 vítimas fatais, quatro eram policiais, um número alarmante que ressalta os riscos inerentes à atuação das forças de segurança em ambientes de guerra urbana. A perda desses profissionais representa um golpe duro para suas famílias e para as corporações. Os policiais mortos são:

  • Marcus Vinícius Cardoso de Carvalho, de 51 anos, conhecido como Máskara, que havia sido recentemente promovido a chefe de investigação da 53ª DP (Mesquita);
  • Rodrigo Velloso Cabral, de 34 anos, da 39ª DP (Pavuna);
  • Cleiton Searafim Gonçalves, policial do Bope, integrante da tropa de elite da Polícia Militar;
  • Herbert, também policial do Bope, que fazia parte da linha de frente do combate.

A morte desses homens, que dedicavam suas vidas à segurança pública, é um lembrete sombrio da realidade enfrentada pelos agentes em serviço. Eles se juntam a uma triste estatística de profissionais que perdem a vida no cumprimento do dever, vítimas da violência incessante que assola o Rio de Janeiro. Suas histórias são marcadas pela coragem e pelo sacrifício em nome da lei e da ordem.

Além dos policiais, três pessoas consideradas inocentes foram feridas durante a operação, evidenciando o perigo de balas perdidas e o impacto colateral desses confrontos na população civil. Um homem em situação de rua foi atingido nas costas e levado para o Hospital Getúlio Vargas, lutando pela vida. Uma mulher que estava em uma academia também foi ferida, mas felizmente recebeu alta após atendimento médico. Um terceiro homem, que se encontrava em um ferro-velho, também foi vítima da violência, ilustrando a imprevisibilidade e a abrangência dos riscos para os moradores em meio a essas operações de grande porte. Tais incidentes reforçam o debate sobre a segurança de civis em operações policiais em áreas conflagradas.

Represálias e o Impacto na Rotina da Cidade Maravilhosa

A reação do Comando Vermelho não se limitou ao confronto direto nos complexos. A estratégia do crime organizado incluiu uma série coordenada de represálias que visavam desestabilizar a cidade e pressionar as autoridades. As barricadas, erguidas em pontos-chave da Linha Amarela, da Grajaú-Jacarepaguá e em ruas comerciais como a Dias da Cruz, no Méier, geraram um caos no trânsito e na mobilidade urbana. Escolas fecharam as portas, o comércio reduziu o expediente e o transporte público foi afetado, transformando a rotina de milhares de cariocas em um pesadelo.

O temor se espalhou rapidamente. Notícias e alertas sobre tiroteios e bloqueios circulavam em aplicativos de mensagens, aumentando a sensação de insegurança e o pânico coletivo. A medida do Centro de Operações e Resiliência de elevar o estágio operacional da cidade para o nível 2 foi uma tentativa de coordenar a resposta das diversas agências e mitigar os efeitos da crise. A ordem da Polícia Militar para que todo o efetivo fosse para as ruas, inclusive o administrativo, demonstra a gravidade da situação e a necessidade de uma mobilização total para restaurar a normalidade e garantir a segurança da população em um dia de tamanha incerteza.

Um Balanço Preliminar de um Dia Marcado pela Tragédia

O balanço da operação, ainda que preliminar, revela a dimensão da tragédia e a complexidade do desafio enfrentado pelas forças de segurança:

  • 60 suspeitos morreram em confronto com a polícia. Desses, dois eram oriundos da Bahia e um do Espírito Santo, indicando uma possível articulação interestadual do crime organizado.
  • 2 policiais civis e 2 policiais militares perderam a vida em serviço, pagando o preço máximo na luta contra o crime.
  • Além deles, 3 inocentes foram feridos: um homem em situação de rua atingido nas costas, uma mulher que estava em uma academia e um homem que se encontrava em um ferro-velho, evidenciando o perigo das balas perdidas.
  • 81 pessoas foram presas durante a operação, um número significativo que aponta para a desarticulação de parte da estrutura criminosa.
  • A ação resultou na apreensão de um arsenal considerável: 93 fuzis, 2 pistolas e 9 motos, o que representa um duro golpe na capacidade bélica do Comando Vermelho.

Até a última atualização desta reportagem, a ação ainda estava em andamento, com relatos de mais baleados e a tensão permanecendo alta nas comunidades e em outras áreas da cidade. O cenário reforça a urgência de políticas de segurança pública mais eficazes e de um debate aprofundado sobre o modelo de enfrentamento ao crime organizado nas grandes metrópoles brasileiras.

A Luta Contínua contra o Crime Organizado no Rio de Janeiro

A megaoperação nos complexos do Alemão e da Penha é um triste, mas contundente, lembrete da persistente batalha que o Rio de Janeiro trava contra o crime organizado. O Comando Vermelho, com sua estrutura capilarizada e seu poderio bélico, representa um desafio contínuo para o estado e para a sociedade. Enquanto o governo reforça a estratégia de confronto, a população anseia por soluções que tragam paz duradoura e não apenas tréguas pontuais entre um conflito e outro.

A operação, considerada a mais letal da história do estado, certamente terá repercussões profundas, tanto no âmbito da segurança pública quanto no debate social e político. Questões sobre os direitos humanos, a eficácia das táticas policiais em áreas urbanas densas e a necessidade de políticas sociais complementares vêm à tona em momentos como este. O Rio de Janeiro, com sua beleza e suas contradições, segue em busca de um caminho para superar a violência e construir um futuro mais seguro para todos os seus cidadãos.